quarta-feira, julho 10, 2013

O lagarto, animal que acompanha toda a história do ser humano - que é descrito no Livro dos Sonhos, de Artemidoro, como sendo o indício de "sentimentos desprezíveis" - também pode ser visto como um guardião. A exemplo do xamã, que também é um guardião de culturas e conteúdos - suas visões põe a tribo em contato com sua própria cultura ancestral e a mantém viva - o lagarto, na época cristã, adquiriu valor de renascimento, de rejuvenescimento por conta de sua capacidade natural de descamação, que simbolizava aspiração à luz espiritual. O lagarto também podia corporificar a alma, pois acreditava-se que o pequeno animal entrava pela boca das pessoas adormecidas e lhes roubava o espírito por algum tempo. Ao voltarem, os lagartos lhes traziam um novo espírito e enriquecido de novas experiências.

Em "Physiologus" - texto dos primórdios do cristianismo - está relatado que o lagarto, quando envelhece, seus olhos se apagam e ele rasteja para dentro de uma fenda de muro voltada para o oriente. Quando o sol nasce, "seus olhos se abrem e ficam sãos. Tu, também, homem, procura dessa maneira, quando... os olhos de teu coração se tornarem turvos, o Sol nascente abrirá os olhos de teu coração". 
Como animal que "dorme no inverno", o lagarto tornou-se símbolo da morte com posterior ressurreição; entretanto, é também representado em moedas no momento em que é morto pelo deus do Sol ("Apollon Sauroktonos"). Em moedas romanas, era associado à deusa da saúde Salus, por causa da sua capacidade de perda e regeneração da cauda.

Outro lagarto, a salamandra, na simbologia e na crença popular não se encontra presente apenas como o anfíbio conhecido da zoologia, mas principalmente como um ser elementar que tem sua morada no elemento fogo, para infundir-lhe vida e protegê-lo, conforme Paracelso (1493-1541). O autor acredita que esses seres do fogo, de acordo com sua própria natureza, em nada se parecem com o mundo dos homens. Por exemplo, as criaturas da água (ondinas, melusinas), de acordo com a crença popular, não são demônios, mas guardiões do elemento (água) comandados por Deus. Nos livros do Renascimento, ricos em conhecimento especulativo, as salamandras são também chamadas de "vulcanales", e delas surgiriam outros seres híbridos menos puros denominados "flamas".

No "Physiologus", relata-se também uma curiosa tradição segundo a qual a salamandra seria um pássaro frio ("o mais frio de todos os pássaros") e viveria no vulcão Etra. Sem, no entanto, se consumir. Talvez seja uma alusão mal-entendida à lenda de um outro animal mítico-simbólico, a Fênix.

Como vimos, a lagartixa é um animal presente em nossa história dos símbolos desde os primórdios da era cristã, contendo significados diversos, que ora pendem para o bem, ora para o mal, ou seja, simbolicamente, encontra-se no céu e no inferno. Daí a força de seu conteúdo a ser representado como um animal-guardião.

Como diz o livro Tradições Populares, não é prudente espantar lagartixas, pois, assim como grudam nas paredes, elas significam a sorte que adere à casa. A lagartixa simboliza ainda a resistência, por sua capacidade de regeneração.

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